O ANANÁS DE S. MIGUEL
A forma de produção tradicional
Pelo Regente-Agrícola Luís Manuel Agnelo Borges (1952)
Estudo Botânico
O ananás (Ananassa sativus, Lindl.) é originário da América do Sul. Pertence à família das Bromeliácias. É uma planta vivaz, que se propaga pela rebentação da toca, do caule ou da coroa. Consideram-se três grupos de ananases: Rainha, Cayena e de Espanha, sendo conhecidas muitas variedades, entre outras a Carlota Rothchild, Black Jamaica, Montserrat, Old Glob, Globo Russo, Providencia, Pyramides, Otaiti, etc, interessando neste trabalho a Smooth-Cayenne ou Key-Pine, que produz frutos grandes, saborosos, sumarentos, de polpa amarela, atingindo pesos excepcionais.
Foi esta a variedade escolhida e introduzida em S. Miguel, com os melhores resultados, se bem que as características actuais dos frutos sejam totalmente diferentes dos da variedade donde provieram, por terem sofrido mutações de adaptação ao meio artificial, criado pelas estufas, constituindo por assim dizer, sem faltar à verdade, uma variedade regional de características individuais, na constituição, sabor e aroma.
A variedade Smooth-Cayenne tem a raiz fasciculada, medianamente curta; caule erecto, cilíndrico, provido de folhas francamente aderentes pelo pecíolo e ligeiramente embainhadas, com cerca de 0m,50 a 0m,70 de comprimento, de cor verde azulada baça, espessas, rígidas e côncavas, quase desprovidas de espinhos. A inflorescência é uma espiga, com flores azuladas, encimada por um tufo de folhas denominado coroa. O fruto é uma cerose, formada pelo conjunto das bagas da espiga e das brácteas, tornadas carnudas e suculentas.
Notas sobre a introdução e desenvolvimento do ananás em S. Miguel
Foi há cerca de 100 anos, que surgiu a feliz idéia de cultivar Ananases em estufas, na Ilha de S. Miguel. Até então era desconhecido para nós, o «rei da fruta» eleito pela Natureza que tão bem o soube coroar.
Por Outubro de 1848, foi escrito no jornal «O Agricultor Micaelense» (primeiro jornal agrícola, escrito em língua portuguesa), um artigo sobre o ananás, supondo-se ter sido feito por António Feliciano de Castilho, que nessa época era o redactor.
Com frases lisonjeiras como: — «Hino perfumado da terra ao seu Criador», «tem o diadema porque o não pode enjeitar», «tem seduções, que atraem, porque lhas dêo, quem dá tudo», e ainda estoutras convencedoras «limitamo-nos a lembrar a conveniência, que o lavrador poderia encontrar em cultivá-lo; não só para o mercado de sua terra, mas para o dalém mar», «há segundo nos consta exemplos de se já ter creado, e oferecido às bafagens-quentes do sul, frutear»... «dos creados em estufas não falemos; esses se não igualarem os da América pouquíssimo àquem lhes ficarão», — estava assim feita a propaganda do ananás.
Acontece que, por esses tempos, começou a aparecer nos laranjais a terrível «gomose», que gradual e progressivamente os foi dizimando. O orgulho dos micaelenses, as «St’Michael’s Oranges», desapareciam apesar dos esforços da Sociedade Promotora de Agricultura Micaelense (primeira Sociedade Agrícola, que se fundou em território português).
A decadência dos nossos laranjais era acentuada, aliada ao desânimo dos cultivadores, devido à concorrência dos laranjais de Valência.